quinta-feira, 17 de junho de 2010

A força motriz do mundo

A força motriz do mundo
Miguel Garcia

Observei tudo e compreendi que o que move o mundo, tanto no social como no pensamento, é a inveja – admiração infeliz, como bem disse o gênio de Kierkegaard.

Por mais que eu tente, queira e até necessite, não cesso de ouvir as vozes, o ronco que dá movimento, que impulsiona tudo e todos, em toda parte, o Sistema que transforma em energia outras formas de energia.

Por mais que eu faça força para esquecer, negar, transcender, a carga induz e instiga constantemente, essa força motriz impele o mundo, espreita, seduz, devora, esse desgosto pelo bem alheio - palpável ou não, esse apetite voraz, esse ódio velado pelo possuidor de qualquer coisa concreta ou imaterial.

Recentemente ouvi o relato de uma dona de casa, casada, mãe de três crianças pequenas, natural do sul de Minas, Nepomuceno. Ela contou que num dado momento de sua vida, sentindo-se carente do Maravilhoso, do Amor Supremo, de render-se ao Ágape pulsante, procurou uma comunidade evangélica próxima de sua residência e, sem demora, converteu-se - entregou-se a Jesus Cristo e logo após foi seguida na decisão pelo marido e os filhos.

Não demorou muito e já estavam sendo submetidos a um minucioso processo de "des-mundificação" que exigiu uma investigação detalhada do estilo de vida que levavam e hábitos que por ventura contrariassem o estatuto e a ordem de coisas da comunidade.

A senhora contou-me também que na época, seu marido era bem empregado, que eles possuíam casa própria e gozavam de certa tranqüilidade econômica.

Logo vieram as cobranças de dízimos e ofertas especiais dirigidas especificamente a ela e seu marido, junto com ameaças indiretas de castigo e maldição, caso não suprissem as necessidades da "casa do Senhor".

Vencido o estágio de adaptação, ou melhor, sobrevivido à prova de fogo do “discipulado” a que foram submetidos, foram convencidos a tornarem-se meio para o expansionismo e conquistas da comunidade. Foram enviados a um campo missionário, num lugar distante.

Para que tal processo transcorresse a contento dos ideais da instituição o anjo da igreja (pastor) os induziu  a abrir mão de todo o pouco que conseguiram ajuntar à duras penas, ao longo de muitos anos de trabalho. Por fim, obedeceram  ao 'chamado divino': o marido largou o emprego estável, venderam a casa às pressas e por qualquer tostão, confiantes na promessa do pastor de que seriam respaldados com recursos especialmente reservados para esse fim, ou seja, missões. Resultado; foram mais que abandonados e deixados à mercê do próprio azar. Faliram radicalmente e tiveram que voltar para terra natal com recursos próprios e como se não bastasse, acusados de serem incompetentes e pecadores (perdedores), para que o Deus não os tivesse salvo da situação calamitosa em que se encontravam. Lembro-me dessa senhora voltando um olhar desencantado para mim, suspirando e enternando o seguinte desabafo em palavras:

.. "sabe irmão, continuo apaixonada por Jesus, Dele não abro mão jamais (quem sou eu), mas quero distância daquele povo. Foi inveja, irmão, foi tudo inveja daquela gente mesquinha. Eles nem queriam as coisas da gente (queriam melhores), só não suportavam ver que a gente tinha alguma coisa, foi tudo inveja deles".

Esse tipo de história emudece e faz concluir que tudo é inveja de invejosos, que a inveja é o motor dessa estufa de angustias - o mundo dos homens.

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